08/05/2024 às 11h31min - Atualizada em 09/05/2024 às 08h08min

Tia Dag: 100 anos de amor pela educação

Da favela para o mundo: educar é devolver o sonho para alguém

VCRP
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Por Dagmar Rivieri, fundadora da Casa do Zezinho* 

Em abril de 2024 comemoro 70 anos e 30 de fundação da Casa do Zezinho, brinco que são 100 anos de amor pela educação. Há três décadas, a Casa tem sido um espaço de oportunidades de desenvolvimento para crianças, adolescentes e jovens que vivem em situações de alta vulnerabilidade social, que oferece educação complementar, artesanato, saúde, tecnologia, gastronomia e desenvolvimento humano, preenchendo as lacunas deixadas pela desigualdade não só na educação, mas também na saúde pública, habitação e em outros setores importantes.

Tenho muito o que celebrar por esses 30 anos, crescemos, multiplicamos, fomos conhecidos mundialmente, conquistamos paredes coloridas, piscina, quadras de esportes, biblioteca, salas de aula, e agora temos o nosso mais novo projeto, uma sala de games para os jovens, onde poderão aprender sobre tecnologia, criar aplicativos e desenvolver sites.

Comecei com 14 anos a alfabetizar na favela, ainda na época da ditadura militar. Como pedagoga,  logo era mandada embora, porque pensava muito diferente para a época, devido a isso, comecei a trabalhar na minha própria casa, dando aulas para filhos de exilados políticos argentinos, chilenos, brasileiros, comecei a procurar lugar para esconder essas crianças. Mais tarde, eu e meu marido compramos uma casa maior perto da favela do Capão Redondo e foi assim que criei a Casa do Zezinho e meu sonho de educar.

Hoje a Casa do Zezinho atende pelo menos 96 bairros dentro da capital paulista. Atendemos atualmente mais de mil crianças na região do Capão Redondo, um dos distritos mais vulneráveis da cidade de São Paulo. Dispomos de mais de 4.000 metros quadrados de espaço físico, oferecendo uma variedade de oficinas, incluindo arte, gastronomia, informática, reforço escolar, inglês, esportes, audiov11isual, música, atividades psicoeducacionais, teatro e orientação para o mercado de trabalho. Iniciei este projeto em 1994 com apenas sete crianças, e hoje já atendemos mais de 30 mil vidas.

Desde o princípio me preocupo em mapear as competências da periferia. A primeira coisa que devemos trabalhar nesses jovens é a autoestima. A pessoa que mora na favela, pensa que não vai sair disso.   É sobre criar condições por meio da educação, da arte e da cultura para que superem suas limitações sociais e pessoais, e conquistem autonomia de pensamento e de ação para escolher e trilhar seus próprios caminhos.

Em questão da educação no Brasil sinto que voltamos no tempo, em 2022 segundo o IBGE, 40% dos jovens deixaram o estudo por necessidade de trabalhar. Além disso, entre os brasileiros pretos e pardos, 7,4% são analfabetos, mais que o dobro da população branca. Sete em cada 10 jovens que não completaram o ensino médio são pretos ou pardos.

Pensando em proporcionar um futuro melhor para essas crianças e jovens, e oferecer oportunidades para superar as barreiras criadas pela desigualdade, desenvolvi a Pedagogia do Arco-Íris, uma metodologia que tenho aplicado ao longo de 25 anos, ela é uma referência às cores do Arco Íris, que, por sua vez, correspondem às diferentes fases do desenvolvimento de uma criança, tem como foco central o desenvolvimento da autonomia de pensamento, pois a educação, pra mim, é quando a criança ou jovem tem direito de questionar e de participar, a partir de quatro pilares da educação: ser (espiritualidade), conhecer (ciências), saber (filosofia) e fazer (arte). É uma pedagogia que vai crescendo e evoluindo.

Graças a pedagogia do amor e da escuta,  tem Zezinho que se tornou professor, ator, dentista, escritor, jogador, engenheiro. Tem Zezinho fazendo pós graduação, em universidade nos Estados Unidos, no Chile, na Argentina.  Essas conquistas durante meus quase 100 anos de educação, me enchem de orgulho e me trazem sim a sensação de dever comprido, mas ainda sonho com muita coisa e eu não nasci para parar! Meu maior sonho é que a Casa do Zezinho vire um bairro para as crianças e jovens, um bairro completo, com teatro, cinema, massagem, ioga, entre outras coisas.  Espero celebrar muitos mais aniversários e que possa acompanhar todo o futuro e crescimento dessa ONG incrível, que construímos com tanto carinho. 


 
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